.
Quando estás a mudar de casa, repentinamente todo o teu mundo se transforma em caixas.
.
Tudo o que consegues pensar é em caixas. Caixas, onde é que há caixas? Tu vais na rua, entras e sais das lojas à procura de caixas:
-"Há caixas por aqui? Viram por aqui algumas caixas?"
Quer dizer, é só nisso que tu pensas. Tu nem sequer podes falar com as pessoas porque tu não estás concentrado:
-"Cala-te. Não vês que estou à procura de caixas?!"
.
Ao fim de algum tempo, tu entras naquilo de tal forma, que até já consegues sentir o cheiro das caixas à distância. Tu entras numa loja e dizes:
-"Há aqui caixas... snf snf... Há sim senhor, não me venha dizer que não tem caixas... snf snf... MERDA pá, eu até já consigo cheirá-las!..."
Começas a ficar obcecado com as caixas. Começas a gostar do cheiro do cartão e do esferovite pela manhã.
.
Chegas ao ponto em que tu até poderias estar num funeral. Toda a gente ali a velar e a chorar pelos cantos, enquanto tu ficas a olhar para o caixão:
-"É uma caixa bem catita... muito bem-parecida, sim senhor... Alguém sabe onde é que o tipo arranjou esta caixa? Quando ele não precisar mais dela, acham que ele me empresta? É que até tem umas pegas tão jeitosas."
.
E no fundo, no fundo, é isso que a morte representa. Não é? Já pensaram nisto alguma vez?
A morte é nada mais nada menos, que a tua última grande mudança na tua vida. A carrinha funerária é o camião das mudanças.
Os carregadores são os teus amigos, aqueles a quem tu pedirias para ajudar-te numa mudança tão grande como esta.
E o caixão... é aquela caixa grande e perfeita que tu tanto ansiavas e procuravas ao longo da tua vida.
.
O único problema é que... quando a encontras, já estás lá dentro.
.
.